O SILÊNCIO DE DEUS DIANTE DOS GRITOS DA ALMA

INTRODUÇÃO: Texto bíblico principal: Rute 1:19-21

1. É comum as pessoas enfrentarem perdas significativas: Devido à escassez em Belém, a família de Noemi foi a Moabe em busca de uma vida melhor, mas perdeu o marido e seus dois filhos, e ela ficou só. Fracassada, mas acompanhada por Rute, retornou a Belém. “A viagem de Moabe a Belém (no mínimo 100-120km) teria levado em torno de dez dias. Elas desceram da altitude 1.485 m de Moabe para dentro do vale do Jordão, e depois subiram 1.237 m de altitude, cruzando as colinas da Judeia” (John MacArthur). A Noemi, cujos traços eram suaves e alegres, agora estão marcados pela dor, pela perda, pela viuvez e pela pobreza.

2. É frequente os fiéis precisarem lutar com dúvidas sobre a bondade de Deus: Diante de tantos fracassos e perdas de entes queridos, os crentes passam a questionar a Deus, como fez Noemí ao voltar a Belém com “uma mão na frente e outra atrás”. Noemi não finge, não tenta disfarçar sua dor. Pelo contrário, ela a verbaliza de forma contundente, quase como um grito que ecoa a profundidade de sua alma. Ela declara atribui a Deus sua condição!

3. É preciso desenvolver a honestidade emocional diante de Deus: O texto em apreço tem muito a nos ensinar. Ele mostra que Noemi “questionou a justiça insondável de Deus porque, em sua mente, o Todo-Poderoso a havia tornado amarga” (Jo Ann Davidson). Está escrito:

Prosseguiram, pois, as duas [Noemi e Rute] até Belém. Ali chegando, todo o povoado ficou alvoroçado por causa delas. “Será que é Noemi?”, perguntaram as mulheres. Mas ela respondeu:

“Não me chamem Noemi,

melhor que me chamem de Mara,

pois o Todo-Poderoso

tornou minha vida muito amarga!

De mãos cheias eu parti,

mas de mãos vazias

o Senhor me trouxe de volta.

Por que me chamam Noemi?

O Senhor colocou-Se contra mim!

O Todo-Poderoso me trouxe essa desgraça!”

I. NOSSA EXISTÊNCIA PODE SER MARCADA PELO SOFRIMENTO – Rute 1:19

“Não é esta Noemi? A pergunta feita pelos habitantes de Belém não implica necessariamente que eles tiveram alguma dificuldade em reconhecê-la, muito embora as experiências pelas quais Noemi havia passado pudesse ter deixado marcas consideráveis em sua aparência. Ao responder, Noemi fala de sua amargura (v. 20) e de sua aflição (v. 21), especialmente por ter partido ‘cheia’ e voltado ‘vazia’ (ARC). A preocupação maior de Noemi não era a falta de posses materiais, mas o fato de ter retornado só. Portanto, quando seus conterrâneos indagaram ‘Não é esta Noemi?’, o que queriam de fato dizer era: ‘Esta é a Noemi, voltando sozinha e viúva?’ Parecia inacreditável que tanto o esposo quanto os dois filhos tivessem morrido” (Comentário Bíblico Adventista). 

1. O peso da perda das pessoas que amamos nos envelhece mais do que o passar do tempo: Há dores que nos desfiguram mais que o tempo, são feridas que se tornam visíveis até para quem não conhece nossa história. Ao retornar depois de 10 anos longe, as mulheres de Belém ficaram espantadas com a aparência de Noemi, marcada pela dor.

2. Nem sempre voltamos para casa como saímos, pode acontecer de voltarmos com os olhos marejados e o coração despedaçado: Como Noemi, quem parte com sonhos e volta com fracassos carrega no corpo as marcas da alma ferida. A caminhada de Moabe a Belém não foi apenas geográfica; foi uma travessia emocional entre a esperança frustrada e o vazio da perda.

3. As feridas da alma não são visíveis, mas gritam nas entrelinhas do rosto e do silêncio: O sofrimento não nos desfigura apenas por fora, ele redefine a forma como as pessoas nos enxergam – e como nos enxergamos também. Isso explica o alvoroço dos habitantes de Belém com a chegada de Noemi. 

II. PODEMOS CAIR NO ERRO DE ANALISAR NOSSA SITUAÇÃO PELA ÓTICA DO SOFRIMENTO – Rute 1:20 

“O primeiro ato de Noemi em Belém foi mudar seu nome. Ela não quis mais ser chamada de Noemi, ‘agradável, feliz’, mas de Mara, ‘amargura’. Ela estava tomada por um profundo senso de autopiedade. Ela queria que todos soubessem quanta dor, quanta amargura e quanta tristeza latejavam em seu peito. Ela não queria mais ostentar um nome que era a negação de toda a sua dolorosa experiência vivida em Moabe. Ela olhava para o passado e não tinha mais nenhum motivo para alegrar-se” (Hernandes Dias Lopes).

1. Quando a dor dita nossa identidade, nos tornamos prisioneiros do que nos feriu: Noemi não apenas perdeu seus familiares; ela quase perdeu sua essência, permitindo que a amargura falasse mais alto. A ausência de quem amamos grita mais alto do que a presença de tudo o que ainda possuímos; por isso Noemi desconsiderou sua vida, o compromisso de sua amiga e nora Rute e a possibilidade de um recomeço! Assim também somos nós, quando focamos a dor, não enxergamos mais nada!

2. Quando a dor redefine nossa identidade, corremos o risco de esquecer quem realmente somos: O sofrimento tem o poder de mudar até o significado de nosso nome – de agradável para amargo, de esperança para lamento. Noemi não mudou de nome por revolta, mas porque o sofrimento calou sua esperança. Quando a dor se torna nosso espelho, perdemos de vista quem realmente somos.

3. A amargura não muda o passado, mas pode distorcer o futuro se não for tratado com fé: A dor não apenas afeta nossos sentimentos, mas molda nossa identidade, redefinindo como nos enxergamos e como queremos ser vistos. Noemi é uma prova de que o coração ferido costuma pintar o passado doloroso com sombras e o presente com lágrimas, distorcendo nossa visão de futuro. Só Deus para mudar tudo isso! 

III. CORREMOS O RISCO DE AVALIAR A DEUS A PARTIR DE NOSSA DESGRAÇA – Rute 1:21 

“Noemi atribui seu dilema ao Senhor em 1:20-21. Ela diz às mulheres de Belém para chamá-la de Mara (‘amarga’) em vez de Noemi (‘agradável’) por causa da maneira como Deus a tratou [...]. Noemi pertence a uma longa lista de figuras canônicas que sofrem sem nenhuma culpa própria. O grupo inclui, para nomear alguns, José, Josué, Ana, Davi, Jeremias, Ezequiel, muitos salmistas e Jó. A eles se reunirão mais tarde Ester, Daniel e outros. Como Jó e os lamentosos salmistas, Noemi não fica calada em sua aflição. Ela sente-se abandonada, apesar de crer na bondade de Deus (1:6)” (Paul R. House).

1. A maior tentação do sofrimento não é desistir da vida, mas distorcer a imagem de Deus em nosso coração: Note na história de Noemi que, mesmo quando Deus parece estar contra nós, Ele ainda está nos conduzindo a Belém – o lugar onde começa nossa restauração. O grito da alma de Noemi não é sinal de falta de fé, mas de uma fé que é real o suficiente para questionar, para lamentar, para se debater com a realidade de um Deus que permite o sofrimento.

2. Julgar a Deus com base em nossa desgraça é como avaliar um livro por uma página rasgada, perdemos a história da redenção: Quando a dor grita alto, corremos o risco de fazer teologia com lágrimas e ver julgamento onde há graça silenciosa. Se fizermos da tragédia nossa lente, até o Deus da graça parece um Juiz implacável.

3. A dor pode nos levar a conclusões precipitadas sobre um Deus que ainda está escrevendo nossa história: Quando não nos impede de pensar, a dor perverte nossa confiança no Senhor e nossa percepção de Sua bondosa mão.

a) Ela não percebeu que a mão do Senhor, que ela sentia ter se voltado contra ela, estava na verdade trabalhando em seu favor.

b) Ela não notou que Rute, a moabita, a nora fiel que permaneceu ao seu lado, seria o instrumento da providência divina.

c) Ela não imaginou que, em meio à colheita de cevada, um parente remidor chamado Boaz transformaria sua história de vazio em plenitude, de amargura em doçura, de luto em alegria.

d) Ela não tinha ideia de que da linhagem de Rute viria o Messias, o qual morreria para reverter toda a dor causada pela desgraça do pecado.

CONCLUSÃO:

1. Quem analisa a vida apenas pela lente do sofrimento corre o risco enxergar a si mesmo como uma tragédia ambulante.

2. A ausência de respostas não significa ausência de Deus; muitas vezes, o silêncio do Céu é a moldura de um milagre que ainda está por vir.

3. A dor pode nos cegar para os detalhes da providência, mas Deus continua costurando propósitos mesmo quando só vemos retalhos.

4. Enquanto choramos por capítulos de perdas, o Céu já está preparando os próximos atos da nossa redenção.

APELO:

1. Em vez de permitir que a dor defina tua identidade, peça ao Senhor que te ajude a redefini-la.

2. Em meio às desgraças da vida neste mundo, deixe que a graça, mesmo quando silenciosa, escreva os novos capítulos de tua história.

Pr. Heber Toth Armí.

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